Cartago e as Gerras Púnicas

01/02/2025

Por Patrik Roger Pinheiro.

Os Fenícios: do atual Líbano para o mediterrâneio.
Os Fenícios: do atual Líbano para o mediterrâneio.

Cartago foi uma cidade fundada pelos fenícios na atual Tunísia, onde hoje fica a cidade de Túnis. Os Fenícios eram um povo que vivia no norte da Terra Santa, no atual Líbano. Na bíblia, duas cidades fenícias são muito mencionadas: Tiro e Sídon. Espremidos num pequeno pedaço de terra, entre grandes potências, e com o mar Mediterrâneo à sua frente, os fenícios se aprimoraram na arte de navegar, e se espalharam pela costa africana do mediterrâneo. Uma das cidades que eles fundaram, foi Cartago, na atual Tunísia.

Ao passo que os fenícios colonizadores entraram em decadência na terra-mãe, as colônias ocidentais africanas passaram a crescer, sob a liderança de Cartago. Esse crescimento os fez rivalizar com a república romana pelo domínio do mar Mediterrâneo, o que os levou inevitavelmente às refregas hoje conhecidas como guerras Púnicas. 

Antes de iniciar as guerras púnicas: Em vermelho, o império Romano; em cinza, as terras sob domínio cartaginês.
Antes de iniciar as guerras púnicas: Em vermelho, o império Romano; em cinza, as terras sob domínio cartaginês.

Antes de passar a falar das guerras, porém, um pouco sobre a pronúncia: alguns historiadores insistem em pronunciar Cártago, e explicam algo sobre etimologia, pronúncia mais perto da original, etc. Importante lembrar que Cartago (com "ta" como sílaba tônica) é um nome escrito conforme as regras da língua portuguesa, e tem uma pronúncia consagrada em português. E, como se pode ver, não é uma proparoxítona. 


Primeira Guerra Púnica 

A Primeira Guerra Púnica foi a primeira das três guerras travadas entre Cartago e a República Romana. Seu nome deriva do termo punici, que é como os romanos chamavam os fenícios. A guerra ocorreu entre 264 e 241 a.C.

Roma e Cartago eram as duas potências comerciais no mediterrâneo. Cartago possuía uma armada mais equipada e experiente, ao passo que os romanos eram mais eficientes na infantaria, ou seja, o primeiro era melhor pelo mar, o segundo, por terra. Entre Cartago e a península itálica está a ilha da Sicília, e ela foi o palco inicial da refrega.

A Sicília na Primeira Guerra Púnica.
A Sicília na Primeira Guerra Púnica.

Na Sicília, Cartago já comandava algumas cidades. Além disso, havia a independente cidade-estado de Siracusa, e os mamertinos, guerreiros que ocupavam a cidade de Messana (atual Messina), que é a ponta siciliana do estreito de Messina, situado entre a ilha e a península itálica. Já os romanos, estes eram senhores do outro do lado do estreito, na Itália. 

Ocorria que em dado momento, Siracusa fortalecera-se, e os mamertinos sentiram-se ameaçados, pedindo ajuda aos romanos. Para não ficar isolada, Siracusa aliou-se aos cartagineses, trazendo as duas potências para o xadrez militar da ilha. Após algumas escaramuças iniciais, os romanos conseguiram cercar Siracusa e fazer um vantajoso acordo de paz. Então os romanos se voltaram para Agrigento, sob controle cartaginês e fizeram um cerco à cidade. Agrigento era protegida por uma guarda incapaz em número de enfrentar as forças romanas.

Para alegria de Agrigento, o exército cartaginês veio em auxílio da cidade, mas os romanos fizeram uma proteção contra os recém-chegados, ficando cercados eles mesmos, enquanto cercavam a cidade. Nessa situação, os romanos não podiam receber suprimentos de Siracusa. A fome estava apertando tanto para os romanos cercados, quanto para a cidade que eles cercavam, mas os recursos da cidade foram exauridos primeiro, e mediante sinais de fumaça, a cidade pediu para o exército de fora atacar os romanos. O ataque aconteceu, mas os cartagineses perderam a batalha. A guarda da cidade abriu uma brecha e bateu em retirada, deixando os moradores sem proteção nenhuma. A cidade foi saqueada e a população, escravizada.

Roma percebeu que não poderia vencer Cartago somente fazendo cercos na Sicília. Por isso, os romanos criaram uma força naval quase do zero e decidiram levar a guerra para a África, o que por fim culminou na derrota cartaginesa. Como resultado, além de pesada indenização, Cartago teve que evacuar a Sicília e muitas ilhas entre a África e a Itália, e logo perderia a Córsega e a Sardenha para os romanos.

Segunda Guerra Púnica

A Segunda Guerra Púnica foi a segunda das três guerras travadas entre Cartago e a República Romana e ocorreu entre 218 e 201 a.C.

Fragilizado após a derrota na primeira guerra Púnica, Cartago buscou se fortalecer por ampliar sua influência sobre a península ibérica, onde hoje estão Espanha e Portugal. Lá foi fundada a cidade de Nova Cartago, atualmente Cartagena. Havia na península Ibérica mais ao norte a cidade de Saguntum, que transitava entre Cartago e Roma, mas que por fim acabou se colocando sob influência romana.

Aníbal saiu de Nova Cartago, atacou Saguntum, evitou as forças romanas no rio Ródano e atravessou os alpes, aterrorizando o Romanos até ser obrigado a voltar à África.
Aníbal saiu de Nova Cartago, atacou Saguntum, evitou as forças romanas no rio Ródano e atravessou os alpes, aterrorizando o Romanos até ser obrigado a voltar à África.

A segunda guerra púnica começou quando o general Aníbal Barca decidiu subjugar toda a península e, por isso, sitiou Saguntum. Os saguntinos se defenderam ferozmente por 8 meses e esperaram uma ajuda romana que nunca veio, até que por fim foram subjugados por Aníbal. Roma então exigiu que Cartago ou entregasse Aníbal, ou aceitasse a guerra, e Aníbal não foi entregue aos romanos.

Com sua frota ainda existente, mas já inferiorizada em relação ao poderio do passado, Cartago atacou por terra. Da Espanha, Aníbal partiu para sua afamada campanha contra os romanos, em solo romano e decidiu ir pela Gália para depois atravessar os Alpes. O general cartaginês esperava conseguir apoio dos gauleses em sua causa. Mas isso não ocorreu.

O primeiro confronto entre Roma e Cartago na segunda guerra púnica poderia se dar no rio Ródano, já que o cônsul Cornélio Cipião foi enviado para barrar Aníbal ali. O Ródano fica na atual França, a caminho dos Alpes. Mas Aníbal esquivou-se por atravessar o rio num ponto mais ao norte. Cipião enviou o grosso de suas forças à península Ibérica e retornou a Roma, pois previu que Aníbal faria a complicada travessia dos Alpes e atacaria Roma pelo norte.

Aníbal atravessa os alpes. Ilustração de Heinrich Leutemann (1866)
Aníbal atravessa os alpes. Ilustração de Heinrich Leutemann (1866)

Mas Aníbal fez a travessia antes do previsto, e conseguiu pegar os romanos ainda desprevenidos. No norte, as vitórias de Aníbal trouxeram os gauleses da região para o seu lado, aumentando seus efetivos. Entre suas façanhas está a da Batalha de Trebia, onde ele enfrentou as forças de Cipião reunidas com as tropas de Semprônio Longo e venceu. Semprônio Longo estava na Sicília, preparando uma invasão a Cartago, mas recebeu ordens de voltar e defender o norte da Itália.

Já na Etrúria, mais perto da capital romana, Aníbal se depara com as forças do Cônsul Caio Famínio. Aníbal trouxe Famínio para uma emboscada onde seus homens ocupavam uma posição mais favorável, e os cartagineses destroçaram as forças romanas.

Evitando Roma, Aníbal enfrentou, na batalha de Cana, o grosso das forças romanas, na escaramuça mais numerosa em soldados. Com o sol batendo nos olhos dos romanos, Aníbal enfraqueceu seu próprio centro, permitindo que os romanos adentrassem no meio de sua formação, e depois cercou muitos deles. O exército romano foi trucidado e humilhado mais uma vez. Já sem esperanças, agora Roma caía em desespero.

Apesar de tudo, os romanos levavam a melhor na península ibérica, de onde Aníbal partira, tomando controle dela. Cipião, cognominado africano, um dos responsáveis pelas vitórias na Hispânia, pretendeu algo impensável: Atacar Cartago. Levar homens para Cartago quando eram desesperadamente necessários na Itália parecia tolice, mas com as primeiras vitórias de Cipião na áfrica, a ideia foi parecendo cada vez melhor e foi ganhando cada vez mais apoio. 

O invasor romano na África obrigou Aníbal e se retirar da península itálica e retornar para defender a própria pátria. Ali, infelizmente para Aníbal, ele conheceu sua maior derrota, quando seus elefantes ficaram assustados e se voltaram contra suas próprias forças, e ele foi superado pelos romanos na cavalaria.

Cartago, vendo a queda de Aníbal, pediu termos de paz. Roma se tornava agora mais do que nunca uma potência militar sem rivais no mediterrâneo. A Hispânia tornou-se romana definitivamente, o que tem um reflexo importante no modo como nós, brasileiros, falamos. A dominação romana na península fez o latim prevalecer no local onde mais tarde surgiriam os romanos, desencadeando eventos que culminaram no fato de que nós, brasileiros, falamos uma língua que descende do idioma dos romanos. 

Terceira Guerra Púnica

Após a derrota de Cartago na segunda guerra, a nação vencida pagava tributos à vitoriosa Roma e só poderia guerrear e formar exército com a aprovação do senado romano. Ali ao lado, o reino númida, que fornecera a importante cavalaria de Aníbal na segunda guerra, agora era governado por um aliado de Roma, Massinissa, que inclusive lutou ao lado dos romanos na segunda guerra e como prêmio, foi empossado no trono.

Cartago havia perdido províncias para Roma, sua frota foi desbaratada, e mesmo assim os púnicos prosperavam agora de um jeito um pouco diferente: investiram pesado na agricultura e deu certo. Cartago tinha muitos excedentes para vender e prosperar. Isso deixou os grandes agricultores de Roma um tanto inquietos. Seria melhor que Cartago não fosse assim tão próspera e competisse com eles.

Catão, o Velho: "Delenda est Carthago"
Catão, o Velho: "Delenda est Carthago"

O líder dessa campanha era senador Catão, o Velho, que passou a terminar qualquer fala pública com um "Delenda est Carthago" (Cartago precisa ser destruída). Precisamos diminuir impostos, e cartago precisa ser destruída. Devemos honrar nossos costumes, e Cartago precisa ser destruída.

Os Númidas estavam ajudando nessa tarefa. Eles faziam incursões à Cartago, que estava proibida de revidar sem aprovação de Roma... e Roma simplesmente nem dava aprovação para isso, nem vinha proteger os cartagineses. Abandonada por Roma, à Cartago não restou opção senão usar suas forças para repelir os númidas. Mas isso significou que Cartago descumpriu o acordo feito com os romanos, e deu a desculpa que Roma precisava e queria, para invadir a África de novo.

Cartago, em  149 d.C.
Cartago, em 149 d.C.

Dessa vez, a luta seria só em Cartago, e os romanos encontrariam uma feroz defesa dos púnicos, que agora defenderiam seus lares e familiares. A cidade tinha muros fortes e defensores decididos, e quando por fim os romanos entraram na cidade, tiveram que lutar rua por rua, casa por casa. Por fim, a população foi quase toda massacrada, sobrando apenas 50 mil prisioneiros que seriam escravizados... uma pequena fração dos moradores dessa grande cidade.

Findada a última Guerra púnica, a terra onde a cidade de Cartago se ergueu um dia fora amaldiçoada para que jamais houvesse ali reassentamento. Criou-se uma lenda, algo sem evidências documentais, que sal fora jogado naquelas terras, para que nada ali crescesse. Agora, o mediterrâneo era um mar romano, já que as duas margens dele eram territórios romanos. Cartago seria reconstruída mais tarde, pelos próprios romanos, mas agora como uma cidade totalmente romana.

Mais tarde, numa Roma acossada por bárbaros, Cartago foi tomada pelos vândalos. Foi retomada pelos romanos do oriente quando o império bizantino a arrebatou dos vândalos. Mas depois vieram os muçulmanos, e tomaram a região da mão dos bizantinos. Hoje Cartago está dentro da Tunísia, um país muçulmano.

Por fim, em 1985, os prefeitos de Roma e da moderna Cartago, que fica em Túnis, na Tunísia, assinaram um acordo de paz, já que nenhum fora assinado na antiguidade. Ainda bem, o fim das guerras púnicas nos deixa muito aliviados.

Visite as Ruínas pelo Google Maps:

Antigo teatro de Cartago;

Termas de Antonino (Banho romano).

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